Crônica de Natal*

Bruno Pessa
6 min readDec 26, 2020

Com bebê em casa, você não fica esperando meia noite pra celebrar e desejar Feliz Natal aos convivas familiares. Vai dormir antes disso e depois do bebê. Afinal está cansado e sabe que minutos depois será acordado pela pequena criatura com fome. Então meu primeiro momento acordado neste 25 de dezembro de 2020 foi por volta de 1h15, quando Nina demonstrou a agitação típica de quem estava com fome para mamar, abrindo os olhos na cama, entre mim e Amanda. Nós percebemos e me levantei para preparar a mamadeira com leite de fórmula na cozinha, procurando ser cauteloso ao passar pela sala escura, onde sogra e cunhado dormiam.

Porém, ao retornar para o quarto, mamãe havia acalmado o bebê, com chupeta e uma segurada no braço agitado, que costuma ir para o rosto e mover a chupeta da boca. Voltamos a dormir e acordamos com os mesmos sinais de fome por volta de 2h30, quando, aí sim, Amanda se posicionou sentada na cama, pôs Nina no colo e lhe deu a mamadeira. Saciada, a pequeNina se acalmou e pegou no sono sem demora. Eu também, a ponto de levar uma cutucada da companheira minutos depois porque tava respirando alto demais (tipo quase roncando…). É sono pesado que chama, né? Bem-vindo à paternidade de um nascido há quase quatro meses.

Não que sejam apenas noites entrecortadas e sonos fatiados, longe disso. Tem muita recompensa também. Como despertar de manhã com os gracejos corporais e barulhinhos da fofura balbuciando, tentando falar como nós. E quando a mamãe traz ela pra cama, toda serelepe e feliz, pra te dar o bom dia mais gostoso que um pai pode receber? Faz a gente superar a preguiça do feriado natalino pra querer despertar logo e curtir a pimpolha, afinal essa fase vai, como todas as demais, passar logo.

Papai de boca cheia e filhota sonada

O lado bom de não termos aberto os panetones na véspera foi o gostinho de novidade no café da manhã de hoje. Aliás, adulto se sente como criança abrindo presentes de Natal diante de panetones de sabores diferentes e novos para o seu paladar. Nina, ainda distante de degustar panetones, demonstrou indocilidade, impaciência, dando sintomas de estar passando pelo conturbado salto de desenvolvimento dos 4 meses. Amanda, mamãe antenada com os sinais de cada etapa da infância, nos ensinou que, quando o bebê está mamando e se distrai ao passar um adulto ao seu lado, largando o leite e olhando para o adulto, é sinal de que está atravessando esse salto. Foi o que vimos com Nina. No entanto, em seguida se tranquilizou no meu colo e fez um sono no carrinho.

O saldo geral da comilança da véspera, complementada por uma taça de espumante no final do jantar, foi de relativo desconforto estomacal na galerinha. De modo que hoje fui o único a aproveitar do Comte de Neufchatel rosé, que o cunhado nos trouxe ontem. Com moderação e temperança, de modo gradual, pois não sou desses de ficar bêbado — me orgulho, aliás, de nunca ter ficado, e olha que já são 38 primaveras na conta!

Num dos momentos de colo com Nina, Amanda me ajudou a vestir a mochila evolutiva, que mantém o bebê preso ao peito do adulto, de frente, e desci com a pequena para arejarmos e ela se distrair, pois demonstrava irritação em curtos intervalos de tempo. Fizemos uma perambulação pelas áreas comuns do Edifício Golden Palace e de fato a filhinha foi se acalmando, até cochilou. O único apuro que passamos (ou melhor, eu passei porque ela nem percebeu) foi quando botei força demais no “botão” do dispenser de álcool gel da garagem e ele se caiu, revelando o buraco do recipiente, que fez verter considerável porção de álcool gel no chão até que eu conseguisse recolocar o “botão” (eu não sei como chama ao certo esse componente, que a gente aperta para sair o conteúdo do dispenser). Ok, garagem vazia no feriado, (acho que) nenhum vizinho testemunhou, menos mal! Como ainda estamos na pandemia do coronavírus, desci de máscara e não me esqueci da higienização das mãos.

De volta ao apê, vimos o vídeo da retrospectiva-surpresa que o Eliakim montou com imagens da Nina desde que era ainda um projeto na vida do casal, que presente especial! Eu anexei um vídeozinho de 1 segundo, relativo ao dia de hoje, da Nina para a compilação do aplicativo One second everyday e digo que vem aí mais uma retrospectiva especial do nosso maior presente do ano! Quando não estava com o baby, tomava meu rosé e curtia os acepipes de Natal. Quebrar nozes gera uma sujeirada gostosa de cascas partidas, afinal eu só quebro nozes no Natal, quando é feriado e não trabalhamos. Aliás, vivemos mais um recesso de duas semanas na ADS Comunicação Corporativa, onde trabalho faz mais de 9 anos ininterruptos.

Não por muito tempo a Nininha deu trégua: um pouco antes de almoçarmos, houve cocô. E dos baita. Fui limpá-la e, além da fralda, tive que trocar o body — já era a linda roupinha do Natal… Se bem que esse bebê fica lindo até peladinho, só com as Pampers ou Huggies dos primeiros meses de vida. Retornando para a sala, me animei ao ver a máquina recém-adquirida e os cafés (eu cheguei a escrever “cafeses” porque é engraçado, mas além de errado soa escatológico) em cápsula, que aumentam o ânimo para almoçarmos e chegarmos ao agradável momento de saborearmos a bebida.

Durante o almoço do Dia Nacional De Se Requentar Comida De Ontem, em que o salpicão é Trending Topic no Twitter (melhor rede social), assistimos a uma produção Netflix na TV. Revisitamos o pavê também, fiéis a mais uma tradição (ou seria clichê?) do Natal brasileiro. Tivemos Instagram stories pra distrair e precisamos reconfigurar o agregador de streamings da TV smart antes de voltarmos para a programação global, com “Vale a Pena Ver de Novo” ao lado dos Alves fãs de reprises de novelas.

Depois que sogra e cunhado se foram, curtimos mais um pouco de Nina, no colo, no sofá e na cama, ficando de bruços e lateralizando, antes de partirmos para o ritual diário do banho-mesa-cama da primogênita: preparar e dar o banho na banheira, vesti-la com a roupa de dormir, dar a mamadeira reforçada e embalar para as primeiras horas de sono da noite. Na verdade quem protagoniza essa sequência de procedimentos é a mãe, com o pai auxiliando, aprontando o antes e arrumando o depois. Parceria facilita tudo!

Com Nininha mimindo, fui lavar o que ficou de molho no tanque, resultante daquele cocozão da pequena, relatado parágrafos acima. Depois fui banhar, com luz colorida pra relaxar, entretanto a música alta da vizinhança me incomodou. Não que as pessoas não tenham direito de curtir o feriado (ainda mais com um xotezinho maroto de um Falamansa), mas quando você tem um bebê que vai dormir antes das 20h, qualquer exagero ruidoso nessa faixa horária te preocupa — e aí não faz muita diferença se é música alta, reforma na casa ou escapamento de moto rasgando a avenida da indiferença, falta de empatia e respeito para com o próximo. Ou seja: com Nininha no quarto, Amanda e eu reduzimos sensivelmente a produção de ruídos pela casa, mesmo nas conversas.

Obviamente jantamos o “restodontê” (bras.) e, como exageramos na parte carnívora, cortei uns pedaços de tender para congelar. Vimos uns YouTubes (cada um conforme suas preferências) e sorvi mais um pouco de rosé, até me concentrar na redação final deste texto, iniciado com um rascunho de alguns tópicos nas anotações do celular. Poxa, se tivesse que esperar até meia-noite hoje, e não ontem, desta vez conseguiria chegar bem mais perto: são 23h40. Só que é claro que tô caído de sono, e com saudade de reencontrar a filhota, que até paradinha dormindo é a coisa mais encantadora e apaixonante que vi e senti. Então bora lá aproveitar, pois repito: essa fase vai, como todas as demais, passar logo.

*Esse texto deriva do saudosismo daquele que, durante o período entre a adolescência e o início da vida adulta, anualmente registrava suas vivências e pensamentos de Natal ou último dia do ano em crônicas. Parei em 2002 e, dias atrás, muito tempo após aquele do garoto que passou no vestibular e não tinha muito mais preocupações na vida, pensei: por que não retomar, agora que sou corresponsável por uma vida e 2020 representa nosso primeiro Natal com Nininha?

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Bruno Pessa

Jornalista, doutorando em Comunic. Social, especialista em Jorn. Literário, youtuber de araque e outros quetais. Mais: naotevejeito.blogspot.com